Deficiência de macronutrientes primários (N, P, K) na cultura da cannabis (Cannabis sativa)

“Deficiência de macronutrientes primários (N, P, K) na cultura da cannabis (Cannabis sativa)” por Vítor Grower e Fernando Santiago
A nutrição de plantas é considerada como base para manter uma adequada produtividade das culturas agrícolas. Um dos fundamentos para iniciar qualquer cultivo é conhecer e analisar os elementos presentes no sistema, pois através da qualidade e quantidade dos nutrientes, é possível mensurar quais serão as demandas da espécie vegetal escolhida, para assim tentar aproximar do teto produtivo da cultura.
Nesse aspecto, o químico alemão Justus von Liebig (1850) já mencionava pioneiramente que: “O rendimento de um cultivo é limitado pelo elemento cuja concentração é inferior a um valor mínimo, abaixo do qual as sínteses não podem mais fazer-se”.
Dada a consideração, ele afirma que mesmo um sistema possuindo todos os nutrientes desejáveis pela planta, se apenas um elemento estiver em déficit, todo o sistema não estará no seu ápice e consequentemente a espécie estará distante do seu máximo produtivo. É relevante ressaltar que nessas condições, aumentar a quantidade dos outros nutrientes de nada adiantará se o nutriente que está limitante também não for aumentado (Figura 1).

Dada a importância do equilíbrio de nutrientes para a planta, os mesmos são divididos em macronutrientes (primários e secundários) e micronutrientes. Os macronutrientes primários são o N (nitrogênio), P (fósforo) e K (potássio). É essencial evidenciar que a disponibilidade de N, P e K está intimamente relacionada com o perfil fitoquímico da planta (canabinóides, terpenóides, entre outros).
Os nutrientes N-P-K são elementos com alta mobilidade dentro dos tecidos vasculares da planta, portanto quando ocorre um déficit nutricional de algum deles, as primeiras manifestações de desordem nutricional acontecem nas folhas velhas (terço inferior da planta) (Figura 2). Quanto à mobilidade no solo, podemos classificar como: N (alta mobilidade), P (baixa mobilidade*) e K (baixa mobilidade**).
*O P é um elemento que fica complexado a óxidos de ferro e de alumínio, onde pode ocorrer de apenas 20-30% do fósforo adicionado ao solo ser disponibilizado para as plantas. Nesse aspecto, é importante ter atenção ao solo do cultivo, onde aumentando/alcalinizando o PH do solo através da calagem como exemplo, haverá considerável precipitação de Al+3, disponibilizando maior quantidade de P para a cultura.
**O K também apresenta baixa mobilidade no solo, onde é relevante a escolha de fontes com concentração adequada de K2O para a cultura (Quadro 1).


O que você vai encontrar aqui:
Nitrogênio (N)
O nitrogênio é absorvido pelas raízes nas formas moleculares NO3 ou NH+4, sendo o nutriente mais consumido pela planta e altamente demandado nos estágios vegetativos. O N está relacionado com vários processos fisiológicos (fotossíntese; trocas gasosas; transpiração; absorção de nutrientes; diferenciação celular, entre outros) e metabólicos (primário e secundário).
Nesse aspecto, se a adubação nitrogenada está ideal, a densidade foliar da planta será alta e consequentemente a atividade fotossintética também, ocorrendo uma intensa produção e translocação de fotoassimilados por toda a planta, o que gerará intensa produção de biomassa.
Os sintomas e danos da deficiência de nitrogênio incluem: sub-desenvolvimento (nanismo); amarelecimento e clorose da folhagem velha (inferior), evoluindo para folhas do terço médio ao longo do tempo; folíolos menores; folhas adjacentes as inflorescência (brácteas) com coloração amarela, caso a deficiência esteja generalizada, poderá chegar nas brácteas dos Bud´s superiores (Top Bud´s); inflorescências menores; menor densidade caulinar; em estádios avançados, pode ocorrer queda foliar (abscisão) e senescência precoce da planta. Todas essas desordens originadas do déficit de N pode gerar perda de produção de biomassa em 50% ou mais (Figuras 3 e 4).


Fósforo (P)
O phosphorus é absorvido pelas plantas nas formas moleculares H2PO4–, HPO42- e não diferentemente do N, participa de vários processos fisiológicos da planta, como: geração de energia; fotossíntese; metabolismo e translocação de carboidratos; respiração; ativação de enzimas; fixação de N; síntese de lipídeos, entre outros.
O fósforo é um nutriente bastante demandado pela planta para formação de raízes, onde uma adubação correta irá maximizar o calibre radicular e dessa forma haverá uma maior captação de água e nutrientes pelas raízes. Além do mais, também está relacionado com a produção de metabólitos secundários (ex: canabinóides – os quais demandam grande carga de fotoassimilados para serem produzidos).
Os sintomas e danos da deficiência de fósforo comumente são: folhas inferiores com coloração verde-arroxeada (desordem na produção do pigmento antocioanina – coloração roxa); lâminas foliares menores; diminuição da quantidade de folíolos; inflorescências com tamanho reduzido; diminuição na altura da planta; atraso na formação das primeiras flores; senescência prematura de folhas; diminuição da produção de THC (Tetra-hidrocanabinol) e CBD (Canabidiol) nas brácteas; maturação desigual de flores (Figuras 6, 7 e 8).



Potássio (K)
O potássio é absorvido pelas plantas na forma iônica K+. Semelhantemente ao N-P, também atua em diversos processos fisiológicos da planta (regulação de abertura e fechamento dos estômatos, evitando transpiração excessiva; crescimento celular e consequentemente meristemático; produção de fitohormônios; translocação de fotoassimilados; ativação de enzimas, entre outros).
É importante ressaltar que o K é um nutriente bastante demandado pela planta nos estádios de floração, participando ativamente da produção de flores, onde em faixas ideais, contribui desde a quantidade e qualidade ao enchimento das flores.
Os sintomas e danos da deficiência de potássio incluem: amarelecimento iniciando da borda das folhas evoluindo para as nervuras centrais; queima das bordas (necrose) nas folhas mais velhas; baixo desenvolvimento radicular; densidade foliar comprometida, com folíolos menores; folhas com aspecto de murcha (devido à falta de controle da transpiração); abortamento de flores; flores com tamanho reduzido (enchimento comprometido); baixa resistência a patógenos e insetos (o K controla a economia de água nos tecidos vegetais, influenciando na resistência a vários estresses bióticos a abióticos); diminuição da produção de metabólitos primários, como proteínas; diminuição da produção de metabólitos secundários, como os canabinóides THC (Tetrahidrocanabinol), CBD (Canabidiol) e CBN (Canabinol) (Figuras 7, 8 e 9).





Considerações importantes sobre Deficiência de macro-primários (N-P-K)
- É necessário conhecer o nutriente que se suspeita de estar ocasionando a deficiência. Nesse sentido, entender a mobilidade do elemento no solo e dentro da planta é fundamental;
- Podem ocorrer semelhanças de sintomas de deficiência nutricional com o Light Burn (Over Light), onde existe uma queima das folhas, geralmente as folhas do terço superior da planta, por estarem mais próximas da luz;
- Podem ocorrer semelhanças de sintomas de deficiência nutricional com excesso de fertilizantes (Over Fert), onde existem características como: seca e enrolamento das pontas foliares. Uma maneira de avaliar se está ocorrendo Overfert é analisar a saída de água do flush (PH, EC);
- Se houver adição de fertilizantes orgânicos, observar se toda a matéria orgânica já foi mineralizada e está apta para a planta, para não gerar toxicidade devido a acidez e aumento de temperatura, o que poderia prejudicar o sistema radicular. Caso não esteja mineralizada, deixar o solo ou substrato “descansar” por algumas semanas;
- Atentar se não está ocorrendo um exagero na quantidade de fontes de nutrientes;
- Podem ocorrer semelhanças de sintomas deficiência nutricional com fitotoxicidade causada por algum produto aplicado de forma foliar;
- Cada genótipo (strain) possui certa especificidade quanto à exigência nutricional, podendo ser baixa, média ou alta.
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